Necrose avascular da cabeça femoral: sintomas e tratamento

Entenda causas, sintomas, diagnóstico e opções de tratamento da necrose avascular da cabeça femoral (osteonecrose do quadril).

Dr Gabriel Benevides

6/9/20254 min read

Resumo em 30 segundos:
A necrose avascular da cabeça femoral (também chamada de osteonecrose do quadril) ocorre quando há redução ou interrupção do fluxo sanguíneo para a cabeça do fêmur. Sem sangue suficiente, o osso enfraquece e pode colapsar, levando à dor e à artrose do quadril. O diagnóstico precoce aumenta as chances de preservar a articulação com tratamentos como descompressão e enxertos; nos estágios avançados, a prótese total do quadril costuma ser a solução mais eficaz.

O que é a necrose avascular da cabeça femoral?

A necrose avascular (ou osteonecrose) é a morte do tecido ósseo por falta de suprimento sanguíneo, a mesma lógica que acontece no infarto do coração, porém em alguma parte do osso. Costuma-se pensar que o osso é um feito de cálcio e mais nada, porém o osso é um tecido vivo, com metabolismo ativo e em constante remodelamento. Quando ocorre a morte de parte do osso, ás celulas ativas morrem e a matriz mineralizada com cálcio permanece. Porém o restante, apesar de calcificado, não tem a resistência mecânica para aguentar a carga cíclica que passa pelo quadril por muito tempo, e com o tempo acontece a fratura subcondral e posteriormente o colapso da cabeça femoral, com perda da esfericidade e achatamento. O final disso tudo, é a artrose de quadril e dor decorrente desta.
Embora possa ocorrer em diversos ossos, o quadril é o local mais acometido devido à combinação de irrigação vulnerável e altas cargas que incidem sobre a articulação.

Principais causas e fatores de risco

A condição é multifatorial. Entre os fatores de risco mais reconhecidos estão:

  • Traumas do quadril, como fraturas do colo do fêmur e luxações, que podem danificar os vasos que nutrem a cabeça femoral;

  • Uso prolongado de corticosteroides em doses elevadas;

  • Consumo excessivo de álcool;

  • Doenças sistêmicas: lúpus, anemia falciforme, distúrbios de coagulação, doença dos caixões (disbarismo), Gaucher, entre outras.

É importante saber: Em muitos casos, não há uma causa única identificável (idiopática). O risco de acometimento bilateral (nos dois quadris) existe e deve ser investigado na avaliação inicial.

Sintomas: quando desconfiar?

  • Dor profunda na região da virilha, que pode irradiar para glúteo ou face anterior da coxa;

  • Piora com a carga (caminhar, subir escadas) e, nos estágios tardios, dor em repouso;

  • Limitação de mobilidade conforme a deformidade progride.
    A intensidade da dor nem sempre reflete o tamanho da lesão, por isso a imagem é fundamental para estadiar a doença.

Como é feito o diagnóstico?

A avaliação clínica é seguida por exames de imagem:

  • Radiografias: ajudam a identificar sinais de colapso subcondral (por exemplo, o sinal da crescente).

  • Ressonância magnética (RM): é o exame mais sensível no início, detectando alterações que ainda não aparecem na radiografia e estimando extensão da necrose.

Classificação (estadiamento) em linguagem simples

Para orientar o tratamento, utilizamos sistemas de classificação. O ARCO (2019) é um dos mais empregados e divide a osteonecrose do quadril em quatro estágios (I a IV), baseando-se em achados de radiografia, tomografia e RM:

  • Estágio I: radiografia normal; alterações visíveis apenas em RM.

  • Estágio II: alterações ósseas (esclerose/cistos), mas sem colapso.

  • Estágio III: colapso subcondral (sinal da crescente) e/ou achatamento da cabeça.

  • Estágio IV: artrose estabelecida com comprometimento acetabular.

Tradução prática: chamamos de pré-colapso os estágios antes de deformidade evidente (I–II). Nessas fases, há maior potencial de preservar a articulação. No pós-colapso (III–IV), as estratégias mudam e, muitas vezes, a artroplastia (prótese) é a opção mais previsível.

Opções de tratamento

A escolha depende de estágio, tamanho e localização da lesão, idade, sintomas e expectativas do paciente.

Medidas não cirúrgicas (podem aliviar, mas raramente “curam”)

  • Moderação de carga/uso de muletas e ajuste de atividades;

  • Controle rigoroso dos fatores de risco (álcool, tabagismo; uso de corticoide somente quando indispensável);

  • Analgesia e fisioterapia focada em mobilidade e fortalecimento, conforme orientação médica.
    Essas medidas podem aliviar dor e retardar a progressão, mas, isoladamente, não restauram o osso necrosado.

Procedimentos de preservação do quadril (fases iniciais)

  • Descompressão central (core decompression): perfurações controladas na cabeça femoral para reduzir pressão e estimular revascularização; pode ser combinada a enxertos (autógenos, alógenos ou substitutos) e concentrado de medula óssea.

  • Enxerto vascularizado de fíbula: técnica mais complexa que leva osso com irrigação própria para a cabeça femoral.
    É importante lembrar que estas técnicas são viáveis apenas quando ainda não ocorreu colapso da área de necrose, quando ainda é possível evitar deformidade e adiar (ou evitar) a prótese.

Cirurgia nos estágios avançados

  • Prótese total do quadril (artroplastia total): indicada quando há colapso e artrose com dor e limitação significativas; oferece alívio da dor e recuperação da função na maioria dos pacientes.

Nota ao leitor: No Brasil, revisões recentes em ortopedia reforçam a importância do diagnóstico precoce para candidatar pacientes a terapias preservadoras e direcionar adequadamente os casos avançados à artroplastia.

Perguntas frequentes

1) A osteonecrose sempre precisa de prótese?
Não. Em fases iniciais, há chance de preservar a cabeça femoral com descompressão e enxertos. A necessidade de prótese aumenta quando já existe colapso e artrose.

2) Corticoide causa osteonecrose?
O uso prolongado em altas doses está associado a maior risco, especialmente em pacientes com transplantes e doenças autoimunes. A indicação deve ser sempre individualizada e acompanhada.

3) A ressonância magnetica (RM) é realmente necessária?
Na suspeita clínica e com radiografia normal, a RM é o exame que confirma e estadia a doença mais precocemente.

Quando procurar um especialista?

Se você apresenta dor persistente na virilha ou pertence a grupos de risco (uso crônico de corticoides, consumo excessivo de álcool, doenças hematológicas/autoimunes, história de trauma no quadril), procure avaliação com ortopedista especialista em quadril. O tempo entre os sintomas e o diagnóstico pode definir a possibilidade de salvar a articulação.